Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.
Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.
e solidão.
Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.
outra parte
delira.
Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.
Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.
Traduzir-se uma parte
na outra parte
- que é uma questão
de vida ou morte -
será arte?
Ferreira Gullar.
"Bom, como eu não queria colocar outro poema triste, decidi colocar esse do Ferreira Gullar, autor que gosto muito, e que nesses versos fala da inconsistência de nossas vidas, das diversas maneiras como somos, da mutabilidade e da diversidade de identidade que podemos ter, sendo ao mesmo tempo uma coisa e seu oposto."
Átila Siqueira.