Prezado
leitor, eu peço encarecidamente que leia o texto todo ou que não o
leia.
Quando
falamos em legalização de todas as drogas, não estamos falando em
apologia ao uso de entorpecentes, como vão sugerir alguns leitores
menos avisados e pouco familiarizados com as discussões mais
recentes sobre o assunto. Muito pelo contrário, estamos falando de
uma campanha que tem por um de seus objetivos a diminuição da
quantidade de usuários de drogas no Brasil. Essa campanha,
inclusive, parte de uma pessoa que não bebe, não fuma, não usa
drogas e que tem um histórico de trabalho em projetos sociais
voltados para o combate ao uso de entorpecentes.
Alguns
poderão dizer que legalizar e liberar todas as drogas no Brasil vai
aumentar a quantidade de usuários, que todos vão se tornar
drogados, que as crianças e os jovens vão ter acesso a todas as
drogas, inclusive acesso as drogas pesadas como o crack. A essas
pessoas eu pergunto: Alguém hoje deixa de usar drogas porque é
proibido? Alguém hoje tem dificuldade em ter acesso as drogas? As
crianças e os jovens já não têm acesso as drogas, inclusive
dentro das escolas e em todas as classes sociais no Brasil? A
situação atualmente é a seguinte: embora haja uma proibição da
venda de drogas no Brasil, em qualquer lugar se consegue comprar
drogas com extrema facilidade, inclusive dentro das escolas. Há
traficantes que entregam até a domicílio, e as pessoas, devido a
proibição, muitas vezes se sentem até mesmo mais tentadas a usar
entorpecentes, como um desafio a sociedade e aos parâmetros mais
conservadores pré-impostos.
A defesa
da legalização das drogas no Brasil vem então para tentar remediar
esse problema de uma forma diferente das medidas que foram sendo
tomadas até agora, e que fracassaram completamente, gastando
recursos do Estado e ceifando vidas em uma guerra inútil e
desnecessária, pois os gastos e os esforços despendidos até aqui
na tentativa de evitar que as drogas entrem no país foram elevados e
não trouxeram resultados, o que também tem sido visto em todos os
países do mundo.
O
objetivo central dessa campanha é diminuir a violência no Brasil,
tirar o poder econômico, social e mesmo político do crime
organizado.
A
primeira questão que precisamos levantar é que o tráfico de drogas
é mais nocivo a sociedade atualmente do que o uso de drogas em si.
Atualmente no Brasil, quase 80% dos crimes e dos presos tem relação
direta ou indireta com o tráfico de drogas1.
O tráfico é responsável pela grande maioria dos assassinatos que
ocorrem hoje no Brasil. E o pior de tudo: o tráfico de drogas é que
financia o crime organizado no Brasil. A maior parte da violência
urbana que temos visto atualmente são financiadas pelo tráfico.
Mesmo crimes como arrombamentos e roubos de carros, roubos diversos a
comércios e a residências têm referência direta ao tráfico de
drogas, pois são os traficantes que receptam os produtos roubados em
troca de pagamento de dívidas, em troca de drogas e mesmo para o uso
pessoal deles. Ou seja, em outras palavras, não só o tráfico em si
e a violência do poder econômico dos bandidos ocorre graças ao
tráfico de drogas, mas também os demais crimes no Brasil têm
relação direta com o tráfico, pois são financiados pelos
traficantes, com o dinheiro da venda ilegal de drogas.
É por
isso que propomos a legalização de todas as drogas no Brasil. A
legalização acabaria com o tráfico, pois as drogas seriam vendidas
nos comércios legais, como já acontece com o cigarro e com as
bebidas alcoólicas, passando por um controle de qualidade e pagando
impostos. Os lucros seriam revertidos aos comerciantes, gerando
emprego e renda para a população. A droga poderia ser mesmo
produzida no Brasil, tanto para fins comerciais como para o uso
pessoal, o que acabaria com a importação e com a perca de capital
para outros países. Os impostos poderiam ser revertidos para as
campanhas de incentivo ao não uso das drogas e para a recuperação
dos viciados, bem como para a saúde e para a educação, de uma
maneira geral. O usuário, ainda por cima, não seria aliciado pelo
crime organizado, pois não compraria a droga na mão de criminosos,
mas sim em um comércio legalizado
A
questão que nos move hoje é a situação de que o crime organizado
atual e toda a violência urbana em que vivemos é fruto do tráfico
e da proibição, e não das drogas em si. Aqueles que questionam o
quanto as drogas são nocivas para os seres humanos, devem também
questionar o que tem levado os indivíduos a usarem drogas tão
compulsivamente em nossa sociedade, pois o que temos visto pelas ruas
é que as pessoas infelizmente cada vez mais desejam se drogar, seja
com maconha, crack, cola de sapateiro e tiner. Atualmente, ainda que
a proibição as drogas conseguisse eliminar o uso das drogas
ilícitas, ela não conseguiria acabar ou mesmo diminuir o uso de
entorpecentes como o tiner, que foi a droga pesada usada em grande
escala na segunda metade da década de 90 e na primeira metade da
década de 10 do segundo milênio, sendo substituída depois pelo
crack.
Infelizmente
o que atualmente tem impedido que essa questão da liberação de
todas as drogas e de suas consequências boas a sociedade seja
debatida com seriedade é a falta de informação por parte de nossa
sociedade, o conservadorismo de alguns setores da sociedade
brasileira e principalmente, a imposição imperialista da política
estadunidense, que tem receio que as drogas sejam liberadas por todo
o mundo, uma vez que a maior parte delas são produzidas de folhas
nativas da América do Sul e da América central, o que poderia
representar um grande potencial comercial a essas duas regiões. Essa
pressão ocorre pelo receio de que a região saia da área de
influência da exploração estadunidense e se torne independente e
venha mesmo a exportar drogas de forma legalizada para os Eua,
atrapalhando seus planos e revertendo a atual situação comercial da
região. Tanto é que o cigarro e as bebidas alcoólicas, as quais
eles produzem em grande escala, não são proibidas, embora sejam tão
nocivas quanto as drogas proibidas.
O que
estamos colocando então, é que o mais nocivo a sociedade atualmente
é a proibição, que gera o tráfico e financia a criminalidade. O
usuário e o uso de entorpecentes de forma doentia se combate com
educação pública de qualidade, com campanhas educativas, e, no
último caso, é ainda mais democrático deixar que alguém decida o
que fazer da sua vida do que tentar proibir a força e criar todo
esse poder paralelo nas mãos do crime organizado. Ao mesmo tempo,
legalizar as drogas acabaria com o dinheiro do crime organizado, e
teríamos mais segurança nas ruas, pois os criminosos estariam menos
estruturados, com menor quantidade de dinheiro para adquirir armas,
para aliciar os jovens e mesmo para subornar autoridades e para
contratar advogados caros. A vida do crime se tornaria mesmo muito
menos atrativa aos jovens, que então poderiam estar mais propícios
a buscar um outro caminho, que talvez possa ser o caminho da
educação, caso a nossa sociedade venha a trabalhar para um processo
real, significativo e sério de valorização da educação nesse
país.
Ao meu
ver, tudo o que é proibido e que as pessoas desejam muito gera
tráfico. Se proibirmos os cigarros e as bebidas alcoólicas, iremos
criar traficantes desses produtos, como já ocorreu nos Eua com Al
Capone, um bandido conhecido mundialmente e que tinha suas atividades
basicamente sustentadas pelo tráfico de bebidas alcoólicas na época
da lei seca nos Eua. A questão hoje é que as pessoas querem se
drogar e na verdade, quando vemos a história da humanidade, elas
sempre quiseram em algum grau. Diminuir isso só se faz com educação.
Proibição só gera consumo ilegal e tráfico, ou seja, dinheiro
para o crime organizado. Em minha opinião, se proibirmos suco de
laranja e café teremos amanhã grandes traficantes desse produto no
brasil, portando armas sofisticadas e financiando o crime. Quando eu
digo isso, algumas pessoas me dizem: “então vamos liberar os
assassinatos”. Mas percebam, é algo completamente diferente. O
usuário de drogas faz um mal a si mesmo, assim como o alcoólatra, o
fumante, o cheirador de tiner e o viciado em remédios. O problema é
o tráfico. Assassinatos são crimes de outra natureza, que se
referem a tirar a vida de outra pessoa, e isso sim pode ser evitado e
combatido com êxito, tanto com repressão quanto com campanhas
educativas.
A
liberação de todas as drogas é o caminho para a diminuição do
uso de entorpecentes, para o fim dos altos níveis de criminalidade,
para o enfraquecimento do crime organizado e para o tratamento e
recuperação dos usuários.
Pela
legalização de todas as drogas no Brasil:Acabando com o tráfico e
com o crime organizado.
Por: Átila
Siqueira – Historiador, escritor e militante de esquerda.
1http://www.polmil.sp.gov.br/unidades/damco/drogas.asp
; http://www.comseguranca.com.br/novo/depquimica_artigo5.php
; http://www.pime.org.br/missaojovem/mjdrogasviolencia.htm
;
http://www.istoe.com.br/reportagens/23565_DROGAS+APERTANDO+O+USUARIO?pathImagens=&path=&actualArea=internalPage
;
http://www.onu.org.br/estudo-do-unodc-mostra-que-partes-das-americas-e-da-africa-registram-os-maiores-indices-de-homicidios/
;
http://www2.forumseguranca.org.br/content/o-tr%C3%A1fico-de-drogas-il%C3%ADcitas-uma-modalidade-do-crime-organizado